ASPECTOS INSTITUCIONAIS E ADMINISTRATIVOS
A promoção e a adoção de medidas de manejo aliadas à celebração de acordos de pesca, para reduzir a degradação de ecossistemas aquáticos e garantir alternativa econômica sustentável ao desmatamento, dependem do sucesso da atuação integrada de órgãos públicos das diversas esferas de governo, da mobilização da sociedade civil e do interesse do setor privado. Assim, o WWF Brasil conduziu a implantação do projeto Pesca Sustentável por meio de um arranjo interinstitucional em que se engajaram atores como: (i) Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e Fundação Nacional do Índio (Funai), pelo Governo Federal; (ii) Instituto de Meio Ambiente do Acre (Imac), Secretaria de Extensão Agroflorestal e Produção Familiar (Seaprof) e o Batalhão de Polícia Militar Ambiental (PM Ambiental/Acre) como representantes do governo do Acre; (iii) Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal do Avre (Ufac) e Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, representando os centros de tecnologia; e (iv) a associação Colpaf e organizações associativas do povo Kaxinawá (Huni Kuin), pela sociedade civil. No âmbito do projeto, também foram realizadas conversas com representantes do setor privado para elaboração de diagnóstico sobre a cadeia do pirarucu.
O projeto contou ainda com uma equipe do WWF, responsável pela coordenação executiva e operacional de todas as ações desenvolvidas, de forma que o arranjo administrativo proporcionou a execução de ações interdependentes executadas de forma articulada e integrada com as instituições parceiras.
INDICADORES DE RESULTADOS E IMPACTOS
As atividades do projeto contribuíram para os resultados relacionados à componente “produção sustentável” (1) do Quadro Lógico do Fundo Amazônia.
Componente Produção Sustentável (1)
Efeito direto 1.1: Manejo de pirarucu implementado
Efeito direto 1.2: Cadeia produtiva do pirarucu manejado com valor agregado ampliado
Os principais indicadores pactuados para o monitoramento desses efeitos foram:
- Número de acordos de pesca aprovados coletivamente e submetidos ao órgão competente (indicador de efetividade):
Meta: 15 acordos. Resultado alcançado: 19 acordos
Dos 19 acordos de pesca aprovados coletivamente e submetidos ao órgão competente, sete foram regulamentados. O WWF relatou permanecer atuando nas frentes de mobilização com as lideranças indígenas das TIs e gestores da Funai para juntos reforçarem as tratativas com o Ibama para que os demais acordos submetidos ao órgão em 2016 sejam regulamentados.
- Número de indivíduos diretamente beneficiados pelas atividades apoiadas pelo projeto (indicador de efetividade)
Meta: 920 indivíduos. Resultado alcançado: 1.627 indivíduos
As atividades do projeto beneficiaram diretamente 1.627 indivíduos, entre ribeirinhos e indígenas.
- Número de organizações comunitárias fortalecidas (indicador de efetividade)
Meta: 3 organizações. Resultado alcançado: 3 organizações.
O projeto apoiou o fortalecimento da associação Colpaf; Aspakno, organização indígena que representa o povo Kaxinawá da TI Nova Olinda; e Askapa, organização indígena que representa dez aldeias Kaxinawá da TI Praia do Carapanã.
- Receita obtida com a atividade econômica de uso sustentável apoiada pelo projeto (indicador de efetividade)
Meta: aumento em 30% da receita obtida com a comercialização do pirarucu manejado de forma sustentável
Resultado alcançado: redução de 7,6% da receita total obtida com a comercialização do pirarucu manejado de forma sustentável
Dos 19 acordos de manejo sustentável do pirarucu elaborados, sete foram regulamentados para o município de Feijó. Assim, no indicador de receita foram computados apenas os dados de pesca e comercialização ocorridos no âmbito dos sete acordos já regulamentados nesse município, no período de 2014 a 2016.
Essa contração do faturamento deveu-se à redução, em termos absolutos, do volume de pirarucu pescado, em consequência da implementação dos acordos de pesca que visam proteger os ecossistemas aquáticos. Tal diminuição ocorreu porque as cotas de pesca autorizadas pelo órgão de meio ambiente foram menores, justamente para que a pesca não se torne uma atividade predatória de curto prazo, mas sim uma atividade sustentável de longo prazo.
Na definição das cotas de pesca para lagos monitorados, o órgão ambiental leva em conta o dado populacional das espécies, a partir de contagens periódicas. No projeto Pesca Sustentável, a medição do indicador considerou o período de 2014 a 2016, tendo em vista que em 2017 não houve pesca autorizada.
Todavia, vale o registro de que houve um aumento de 24% na receita média de cada pescador envolvido nas pescarias, que passou de R$ 650,00/ano em 2013 para R$ 802,87/ano em 2016, em razão da maior produtividade das pescas realizadas.
- Número de lagos sob manejo com critérios de certificação implantados (indicador de produto)
Meta: 10 lagos. Resultado alcançado: 10 lagos
Um dos entregáveis previstos do projeto foi o desenvolvimento de um padrão para certificação do pirarucu manejado, o que foi alcançado. Com aval e apoio técnico da Marine Stewardship Council (MSC), certificadora internacional da atividade pesqueira marítima, elaborou-se um Programa de Melhoria da Pescaria (Fishing Improvement Program – FIP) no âmbito do projeto, com ações para cumprimento de 27 requisitos certificatórios para conquista do selo MSC ao manejo sustentável do pirarucu. O projeto avançou na implantação de 24 desses requisitos no manejo praticado em dez lagos, o que possibilitou a resolução de diversas questões relevantes.
Por fim, vale destacar que foi elaborado no âmbito do projeto estudo de viabilidade ecológica-econômica e do potencial de expansão das práticas de manejo e da cadeia produtiva do pirarucu, de forma a orientar o desenho de ações necessárias para expansão das práticas de manejo e fortalecimento da cadeia produtiva do pirarucu.
RISCOS E LIÇÕES APRENDIDAS
Em linhas gerais, pode-se afirmar que o projeto Pesca Sustentável se desenvolveu a contento, atendendo o objetivo de se adotar medidas de manejo e celebrar acordos de pesca para reduzir a degradação dos ecossistemas aquáticos no estado do Acre. Todavia, para garantir a efetividade do projeto e buscar a consolidação da cadeia é fundamental que sejam adotadas políticas públicas, legislação e regulamentação que valorizem e incentivem a atividade. Por exemplo, pagamento pelos serviços ambientais oferecidos, segurança jurídica quanto à manutenção do seguro-desemprego do pescador artesanal (“seguro defeso”) e a realização de ações educativas e de fiscalização por parte de órgãos de governo tornariam a atividade mais atraente para as populações tradicionais, reduzindo-se a resistência por parte de muitos pescadores. No entanto, a atuação do estado no que tange a esses temas tem-se mostrado insuficiente em razão da descontinuidade de governos e a restrições orçamentárias.
Outra questão que dificulta a disseminação do manejo sustentável do pirarucu e desencoraja muitos atores é o fato de os primeiros anos do processo de consolidação da cadeia envolverem custos para realização de atividades centrais e investimentos em infraestrutura muito superiores ao total da receita gerada. Ações incrementais que agregariam valor aos produtos da cadeia, tais como obtenção de selos de inspeção sanitária e certificações, adoção de inovações técnicas e desenvolvimento de subprodutos, também demandam alto investimento de dinheiro e tempo.
Além disso, tendo em vista as características do pirarucu, é necessário um intervalo razoavelmente longo para a reposição dos estoques, de modo a conquistar cotas de despesca maiores com os órgãos ambientais competentes, que pudessem proporcionar retornos financeiros mais atrativos.
Vale destacar que a mudança do centro de operação gerencial do projeto de Brasília para Rio Branco (AC) aproximou a coordenação do projeto das atividades centrais, na medida em que passou a participar presencialmente de um número maior de ações sensíveis. Com isso, o vínculo entre a entidade e os atores envolvidos foi aprimorado, facilitando a comunicação e o diálogo dentro do projeto, o que, por sua vez, possibilitou uma atuação mais incisiva na gestão de conflitos e, assim, maior celeridade na tomada de decisões e execução de atividades.
Ressalte-se que os conhecimentos relacionados ao tema que foram gerados, sistematizados e compartilhados por meio do projeto, podem auxiliar sobremaneira a definição e implementação de novas iniciativas que visem a adoção de medidas de manejo e celebração de acordos de pesca.
SUSTENTABILIDADE DOS RESULTADOS
A sustentabilidade dos resultados obtidos depende da manutenção da sensibilização e mobilização da população ribeirinha e indígena para a temática da produção sustentável do pirarucu, e da continuidade dos esforços locais comunitários e institucionais, incluindo órgãos de governo. Manter vivo o interesse em preservar ecossistemas aquáticos no âmbito de acordos de pesca na população que faz da pesca na Amazônia meio de sobrevivência e que se vê constantemente em competição com a pesca predatória é central para a efetividade de iniciativas como o Pesca Sustentável.
Tão importante quanto a adoção de novos acordos de pesca é a manutenção da adesão a eles pelas comunidades abrangidas. Conforme já mencionado, ações governamentais incisivas são imprescindíveis nesse sentido.